sexta-feira, 27 de setembro de 2013

              O PROCESSO REVOLTADO



Era uma vez um processo de aposentadoria por tempo de contribuição que tinha uma enorme autoestima e, embora nenhum de seus  PPPs tivesse sido enquadrado pela análise médica, ele lutava por ser reconhecido como especial. Ele não era de se entregar facilmente e mesmo tendo sido indeferido por falta de tempo de contribuição, lutava por seus direitos. E a cada tentativa, ganhava mais algumas páginas, todas elas numeradas e rubricadas, que o tornava cada vez orgulhoso.
É de conhecimento geral que os processos têm variáveis graus de personalidade. A maioria deles, entretanto, é tranquila, acata pacificamente a sua sorte e adormece em qualquer gaveta de arquivo sem criar problema para os companheiros nem para os servidores. Sabemos também que existem aqueles rebeldes, que não aceitam ouvir um não em resposta à suas demandas e que se sentem superiores aos outros processos. Este era o caso do nosso exemplo, o processo --- --- 999-9.
Ele era viajado, já tinha ido para a cidade grande, passara lá três meses  entre outros rechonchudos e experientes processos. E, ainda que tenha sido inútil a viagem, pois o parecer desfavorável de Junta de Recursos o mantinha  indeferido, ganhara no intento mais algumas páginas.
Já na viagem de volta, em pleno malote, entrou em atrito com um processo magricelo e tagarela que estava muito satisfeito porque ia ser concedido. Era um insignificante salário maternidade de poucas páginas, de tempo limitado e sem muitas pretensões e esse vangloriar verborrágico deixou 999.9 tão irritado que ele lhe deu um empurrão tão forte que lhe rasgou a capa.
- Covarde!  Em mulher não se bate! – gritou uma pensão por morte, muito exaltada.
Um auxilio reclusão com cara de poucos amigos e que parecia querer apenas um motivo para procurar briga, partiu para cima da aposentadoria agressora e quase lhe arrancou um colchete. A turma do deixa disso se aproximou e tranquilizou o ambiente. Porém, já em casa, quando todos estavam na caixa à espera de seu novo destino, 999-9 saltou para fora, com certa dificuldade porque estava um tanto gordo,  saltitou até o arquivo e entrou numa gaveta  onde os colegas aguardavam processamento. Lá não deixou ninguém dormir, ficou falando de suas experiências extra-municipais e cheio de vaidade anunciou que ia agora para Brasília, porque tinha se tornado muito importante, quando, na verdade, ia era tentar um último recurso junto à CAJ.
E falava com tal persuasão que todos ficaram admirados com a pseudo trajetória  vitoriosa de um amigo de gaveta. Nunca antes nenhum deles havia saído da APS, tampouco sido indeferido, mas isso era mero detalhe.
Na manhã seguinte, quando Dona Conceição foi organizar os processos viu que faltava um e pediu a um estagiário para procurá-lo. O pobre do rapaz revirou toda a agência até encontrar o fujão em local totalmente inapropriado e o levou para a mesa onde se acumulavam seus desafetos da Junta de Recursos onde ele aprontou outros tantos rebuliços até que seguiu viagem para Brasília onde passou seis penosos meses entre outros processos igualmente revoltados. Quando retornou estava abatido, infeliz e, ainda, indeferido, porém, não conformado e decidido a procurar a ajuda dos meios judiciais.



sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O CASAMENTO DE HISCRE


Era uma vez uma senhorita chamada HISCRE que tinha uma união que já durava há mais de dois anos com o Dr. SABI.  Era um 31* estável que, ao gosto da moça, deveria sem demora evoluir para os laços matrimoniais de um 32* e para isso se empenhava ela. Afinal, tinham créditos em comum. E não eram poucos ao longo de todo esse tempo; a cada mês mais um fruto vingava e a família crescia. E a cada mês a cobrança de um casamento aumentava também.
Entretanto, o Dr. SABI não via com bons olhos o interesse crescente da companheira em abrigar-se em definitivo sob a sua tutela pecuniária. Tampouco aceitava que os persistentes males da coluna não tivessem uma cura, sequer uma melhora, após tantos tratamentos.
Para escapar de situação constrangedora a que vinha sendo submetido, procurou uma saída digna e correta, embora pouco benevolente.  A fim de revisar seu anterior julgamento passou a observar com um olhar clínico rigoroso a casadoira paciente; deteve-se em sua indumentária e concluiu que muitas das dores seriam sanadas se ela descesse do seu equilíbrio precário resultante de quinze centímetros de salto e alcançasse o chão com os próprios pés; que se reduzisse os dez quilos de bugigangas femininas que trazia na bolsa muito amenizaria sua escoliose e que,  por fim,  se aumentasse em cinquenta por cento o resquício de tecido que a envolvia, não teria ela a necessidade de se equilibrar dentro de tão pouco pano a fim de tentar não expor o que exposto invariavelmente estava. O conforto lhe devolveria a saúde.
E assim, após muito analisar prudencialmente a situação com um rigor de ministro de STF, certo  da retidão de seus princípios, com formulação de tese detalhada e adequada ao espirito da lei, para espanto e horror de HISCRE, indeferiu o seu  pedido de prorrogação.
Houve choradeira e ameaças, mas o Dr. SABI permaneceu impassível e não teve recurso que devolvesse a HISCRE os créditos suspensos. E nem cabiam embargos infringentes – uma total injustiça!
Após essas infrutíferas tentativas de reconciliação, a senhorita HISCRE viu-se sem noivo e sem centavo. Não sabia o que fazer. Aliás, sabia, mas não lhe agradava o fato de ter de trabalhar para manter-se. Era tão jovem e bonita, não lhe parecia justo ter de gastar tais predicados atrás de um balcão de loja ou mesa de escritório.
E saiu em busca de um novo pretendente. Para tanto, elevou a altura dos saltos, aumentou o peso da bolsa e diminuiu ainda mais o tamanho das roupas. Entrementes, para seu infortúnio, depois de um tropeção seguido de solavanco, envergou de vez. Tanto que não conseguia se aprumar nem de chinelos e pijama. Teve de recorrer novamente ao Tio INSS, porém, não tinha mais qualidade de segurado e o Dr. SABI não quis mais assunto com ela.  Entretanto o generoso Dr. SIBE dela se apiedou, depois se enamorou e ambos se uniram na harmoniosa e definitiva aliança de um 87* e foram felizes para sempre.


                       
31 auxilio doença
32 aposentadoria por invalidez
                   87 benefício assistencial ao deficiente
                  

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

UMA TRAGÉDIA NO PLENUS

Era uma vez um bem sucedido INFBEN, vaidoso de seu valor elevado, beirando o teto. Orgulhoso, não gostava de se relacionar com seus semelhantes pobres, que representavam o salário mínimo e só procurava amigos entre os de mais alto padrão. Tinha o nariz empinado, diziam seus vizinhos no PLENUS. Era tão altivo que nem olhava para os lados, mas guardava uma certa mágoa por não ter atingido o teto máximo.
Mamãe PRISMA dizia:
- Mas ninguém nunca chega a tanto, meu filho.
- Queria muito, mamãe, dar-lhe este motivo de orgulho. – respondia ele com sua vozinha fina.
Papai CNIS, desviando os olhos do jornal, um dia considerou:
- Peça uma revisão; não tem ainda dez anos.
E assim fez INFBEN.
Um dia, enquanto ainda aguardava a resposta de seu requerimento, sentiu uma pontada nos créditos e, desde então,  não gerou mais nenhum HISCRE.
Preocupado, procurou um especialista.
- Com a saúde não se brinca – pensou.
Dr. MOB examinou-o meticulosamente, tirou radiografias, solicitou exames e, ao fim de tudo, diagnosticou.
- O senhor sofre de suspensão.
- Suspensão, doutor? – perguntou o paciente sem compreender de que se tratava a sua doença.
- É. O senhor foi suspenso pela auditoria.
- E é grave isso doutor?
- No seu caso trata-se de um mal hereditário muito sério.
- Oh! Oh! – lamentou-se o doente.
O Doutor MOB receitou repouso e tranquilidade para aguardar o desenrolar dos fatos.
INFBEN voltou para casa abatido e foi logo chorar no ombro da mãe.
- Mamãe, como isso pôde me acontecer? Você e o papai são tão saudáveis, como pude nascer assim tão doente?
Foi  então que Dona PRISMA resolveu contar um segredo familiar até então muito bem guardado.
- Papai CNIS não é seu pai verdadeiro. Seu pai... seu pai era um NIT indeterminado. Um bastardo que herdou uma fortuna, porém não um nome. Enquanto seu pai tinha um nome e não tinha dinheiro algum. Sim, foi uma relação promíscua, devo confessar, mas papai o ama como a um filho.
- Oh! Oh! – gemeu o benefício suspenso – Sou o fruto de uma fraude! Um benefício de proveta!
             A revelação lhe fez tão mal que nunca mais se recuperou. Entrou em depressão, deixou de se alimentar, trancou-se no quarto a chorar até que um dia, amanheceu cessado.