Dona
Conceição, acaba de ser promovida a
perita médica do INSS e isso sem ter que passar por aquelas medonhas aulas de
anatomia, sem precisar remexer indigentes e fedorentas entranhas, sem saber para que servem aqueles
remédios de nome esquisito, nem queimar as pestanas por longos anos de
graduação ou fazer residência em hospital público e sem saber distinguir um
músculo de um nervo, tudo graças a uma nova resolução do INSS. Então, do alto
de seu novo e elevado posto, muito orgulhosa de seu jaleco branco sobre burca
preta, parecendo um pinguim com as cores invertidas, resolveu brindar seus
colegas igualmente promovidos, com algumas dicas pertinentes ao exercício da
nobre atividade de fazer perícias sem entender absolutamente nada de medicina.
A
primeira dica é não se precipitar e ir dando de cara para o segurado mais do que um dia de licença
de cada vez. Assim o perito-administrativo não incorrerá em erro e o segurado
terá que apresentar diariamente um novo laudo a fim de manter o benefício por
mais tempo. Esse expediente tem diversas vantagens, evidentemente, nenhuma para
o segurado. A primeira é que ele logo se cansará de suas idas e vindas à
agência, e retornará mais brevemente ao trabalho, resultando em boa economia
para o Estado, ajudando a equilibrar as contas da Previdência. Outra vantagem é
o segurado valorizar os verdadeiros peritos médicos reconhecendo que pelo menos
eles não eram tão assim tão mãos-de-vaca como achavam antes, pois costumavam
lhes dar um licença um pouca mais longa do que as diárias atuais. Outra
vantagem é aquele segurado revoltado querer
resolver tudo judicialmente, o que aliviará a demanda da APS.
Outra
dica importante é não aceitar laudo que contenha alguma palavra incompreensível
no meio daqueles garranchos habituais, o que inviabilizará a conclusão 98% das
perícias. Também devem ser rejeitados todos os laudos cujo significado seja
incompreensível por escrito no indecifrável dialeto médico; deve-se exigir que
seja traduzido para o idioma dos leigos ou rejeitados peremptoriamente. A
segunda alternativa é a mais recomendada porque resultará na redução de 100% das solicitações.
É
interessante também manter à vista das vítimas, ou melhor, dos segurados, uma
seringa de grosso calibre e bem comprida agulha para desestimular o interesse
na prorrogação do beneficio. Uma mordaça e uma camisa de força também são
eficientes objetos para acalmar os solicitantes mais exaltados.
Por
fim, uma vez que os peritos ficaram aliviados dessa tarefa, devemos negociar a
troca da análise e concessão das aposentadorias. Aos peritos-administrativos caberão
as aposentadorias por invalidez enquanto os médicos peritos ficarão
encarregados das aposentadorias por idade e por tempo de contribuição,
inclusive as dos próprios colegas de profissão, cheias de vínculos e múltiplas atividades.