Dona Conceição, após
árdua e vitoriosa campanha, foi empossada a primeira presidente do
INSS eleita pelo voto direto dos servidores, amplamente apoiada pelos
colegas da excelente autarquia. Entretanto, mal despiu a burca da
posse e os problemas assomaram de tal forma que imediatamente
compreendeu o motivo de ter sido candidata única a tão elevado
posto. Logo ficou sabendo que o INSS estava participando do programa
econômico Verba Zero, o que significava que a instituição teria
que se manter sem receber dinheiro algum e, ainda por cima, realizar
um imenso lucro a fim de tapar o rombo da Previdência. Isso foi o
suficiente para lhe estragar a noite de sono. Tentou contar
carneirinhos para relaxar e dormir, porém, como não tinha nenhuma
experiência pastoril, a empresa não frutificou. O rebanho balia
muito alto, as ovelhas tropeçavam na cerca e, de vez em quando,
aparecia no meio algum bode com seu longo cavanhaque a desestabilizar
a harmonia do bucólico conjunto. Dona Conceição só alcançou o
objetivo almejado quando se viu em seu próprio elemento, contando
mentalmente uma a uma as páginas de um processo de aposentadoria
bastante rechonchudo, com direito a uma reclamatória trabalhista de
895 páginas, o que levou mais de quatro horas, e só depois de
devidamente concedido o benefício e que conseguiu adormecer, pois a
nossa presidente é uma pessoa bastante minuciosa e empenhada em suas
tarefas. Entretanto seu sono foi curto e agitado e logo acordou,
assustada, acreditando ter cometido algum engano na análise do
processo ilusório e reviveu o horror com que a IN 74 assombrara os
seus últimos dias como servidora da linha de frente, o que a impediu
de reconciliar o sono. E agora que pensava que ia ter vida mansa no
posto mais elevado da carreira, eis que tinha que resolver todos os
problemas do Instituto. Pensou até em renunciar, mas não quis
desapontar os seus três eleitores permaneceu firme em sua função.
Em seu primeiro dia no
honorável cargo Dona Conceição, sozinha em seu gabinete
presidencial, começou a dar tratos à bola para seguir as
determinações governamentais citadas acima. Para angariar fundos
imaginou cobrar uma taxa de permanência na agência, assim como se
faz nos estacionamentos. Crianças pagariam meia entrada, mas os
idosos, não, porque eram
a maioria e
basicamente se contava com eles para o abastecimento pecuniário.
Procuradores, evidentemente, pagariam em dobro. Com
o numero de servidores diminuindo a cada dia, o tempo de espera pelo
atendimento aumentaria
sobremaneira, ampliando o lucro.
Depois pensou que essas taxas iriam diminuir o fluxo dos segurados, o
que seria
muito bom para os servidores, porém ruim para o caixa da
instituição. Então, para suprir a deficiência de público
pagante, resolveu cortar pela metade os seguranças. Essa seria uma
boa economia salarial, porém deixaria os servidores, especialmente
os peritos, expostos aos imprevistos do nervosismo de algum segurado.
Por isso seria importante para que os poucos guardas restantes
suprissem a necessidade, que investissem
numa estética mais agressiva como para
ter uma aparência ameaçadora como,
por exemplo, deixar a barba crescer até onde Alá prouvesse.
Evidentemente o efeito seria positivo porque nenhum segurado, por
mais revoltado que estivesse, iria se meter a fazer arruaça na
agência, entretanto isso também faria com que muito segurado pacato
abdicasse o seu direito ao extrato de consignação, resultando em
mais uma queda na arrecadação tributária. Tanto a cobrança de
taxas quanto a aparência pouco
amistosa dos
seguranças resultariam na diminuição do fluxo e a consequente
redução de trabalho dos servidores. Por isso, Dona Conceição,
concluiu que, para economizar e atenuar ‘o buraco na camada de
ozônio’, como eufemisticamente chamava o rombo nas contas do INSS,
seria bom
demitir o pessoal da limpeza e delegar suas tarefas para os agora
desocupados servidores que já estavam mesmo acostumados com o
constante desvio de função.
Dona Conceição começou a
fazer contas levando
em consideração tais providências;
entra tanto por aqui, sai tanto por ali, recebe isso, gasta aquilo e
rombo parecia inalterável. Acabou
se decidindo a deixar
a ortodoxia matemática de lado e solicitou uma consultoria com um
renomado numerólogo que sugeriu que se interpusesse o
sinal de +
entre as colunas de débito e crédito e
somasse tudo e, incrível, esta pequena interferência contábil
resolveu todos os problemas, presentes e futuros, podendo ser
anuladas todas as alterações anteriormente planejadas. E
assim, esta singela
modificação na planilha deixou
todo do jeito que estava e
levou Dona Conceição a ser aclamada a gestora do ano. Foi mesmo uma
pena que,
exatamente neste momento de júbilo, tenha tocado o despertador.
Tanto em sonho quanto na realidade, Dona Conceição tá ferrada rs
ResponderExcluirEngraçado que, qualquer semelhança com a realidade - futuras instalações de vigilância eletrônica e corte de gastos com limpeza, é mera coincidência!
ResponderExcluirDiscutíamos entre colegas sobre venda de imóveis e estadia em casa de parentes para adesão a greve, porém, já há esperança de não haver corte de salário, pois já ficamos sabendo que teve APS que parou de trabalhar por falta de pagamento da conta de energia elétrica!