quinta-feira, 5 de dezembro de 2013

UM CONTO DE NATAL


Todos nós sabemos como a figura do Papai Noel mexe com o imaginário infantil. Eventualmente pode ocorrer que o mesmo aconteça com pessoas cuja idade já não enquadra mais na condição de criança. Este é o caso de Dona Conceição que, embora cada uma de suas pernas já tenha há muito ultrapassado a maioridade, continuava a sonhar em conhecer o bom velhinho.
- O de verdade – repetia ela, inocentemente, a cada fim de ano.
Todo mês de dezembro Dona Conceição era atacada por um violento espírito natalino que a fazia distribuir diversas árvores de Natal pela APS, pendurar enfeites nos computadores dos colegas e ornamentar as paredes com guirlandas coloridas. Era também a única época do ano em que ela se tornava uma servidora dócil, meiga e gentil, para deleite dos segurados. Tal transformação emocional não passava despercebida pela chefia que se aproveitava de sua inusitada boa vontade, e a colocava para atender todos os agendamentos de LOAS, para a felicidade de todos os outros colegas. Qualquer inssano medianamente normal, entraria em desespero com tal condenação, mas o grau de inssanidade de Dona Conceição atingia o clímax no período pré-natalino. 
E qual não foi o seu espanto e felicidade, às vésperas do Natal, em atender pessoalmente o Papai Noel! Vinha o bom velhinho, com sua enorme barba branca, os tradicionais gorro e traje vermelho e uma enorme bengala, acompanhado de um “assessor previdenciário”, termo científico para designar o  popular catador de papel. Dona Conceição ficou tão encantada que chegou mesmo a se levantar e olhar para fora para ver se avistava o trenó com as renas. Felizmente seu delírio a poupou dessa infame miragem.
Quando Papai Noel sentou-se à frente de Dona Conceição, ela começou tremer de emoção.
-Ho Ho Ho – fez o Papai Noel e lhe ofereceu uma bala de papel colorido, que a servidora aceitou muito emocionada.
Enquanto esclarecia que Papai Noel não pudera trabalhar de carteira assinada porque esteve sempre a serviço das crianças, o  acompanhante entregou à servidora uma carteira de identidade de estrangeiro. Os seguintes dados ali estavam impressos: Papai Noel, filho de Vovó Noel, nascido na Noruega em 1812 e com data de chegada ao Brasil em 2013.
Não havia dúvida de que o clima setentrional mantinha a cútis em belíssima forma, pois o velhinho não aparentava ter mais do que quarenta anos.
- Mas, Papai Noel, o senhor não é naturalizado brasileiro! Então, não tem direito a LOAS. – lamentou-se Dona Conceição.
- Não, não – interveio o acompanhante – ele tem essa outra identidade aqui.
A  servidora analisou os dados do novo documento, este de cidadão brasileiro.
- Essa carteira aqui diz que o senhor só tem 43 anos, então só vai ter direito ao LOAS se for deficiente.
- Não, não – interrompeu novamente o catador de papel – essa identidade é minha, a dele é esta outra aqui.
- O senhor também se chama Papai Noel? – perguntou Dona Conceição para o acompanhante, intrigada e levemente desconfiada de que havia ali alguma coisa um tanto suspeita.
- Não, não, meu nome é Pedro Manoel, a senhora se enganou ao ler.
- Hum... – fez Dona Conceição recuperando um pouco da razão e desconfiança habituais.
- Papai Noel, preciso de sua certidão de nascimento. Ou o senhor é casado?
- Non, non, meu filha, eu ser solteiro. Sempre preferir os criancinhas – respondeu ambiguamente e com sotaque carregado o bom velhinho.
E enquanto negava, virava o rosto de um lado para o outro e, com esse movimento lateral, deslocava a imensa barba branca e deixava entrever uma rala barbicha escura.
Hum... – resmungou Dona Conceição que se lembrou que conhecia este rosto há muitos Natais, mais precisamente distribuindo balas à criancinhas que visitavam o shopping que ela costumeiramente frequentava.
- O senhor precisa apresentar também um comprovante de residência em seu nome.
- Eu non ter, non, eu morar num quartinho na terreno do casa desta senhor que me acompanha. – respondeu Papai Noel, mostrando estar já bastante aclimatado aos costumes nacionais.
- Bom – disse a servidora - vou abrir exigência para o senhor apresentar todos os documentos necessários...
- A senhora non está se comportando bem,  assim non vai ganhar presente nesta Natal. Palavra de Papai Noel... – reclamou o pobre velhinho.
Ao que respondeu Dona Conceição:

- E o senhor, se não se comportar bem e apresentar a documentação exigida, não vai ganhar LOAS nenhum. Palavra de Dona Conceição.

4 comentários:

  1. Mandou bem, Dona Conceição. Não se deixou enganar nem pelo Papai Noel.
    É assim que se faz!
    kkkkkkkkkkkkkkkk

    ResponderExcluir
  2. Então ele existe mesmo...quando ele voltar para cumprir a exigência peça a ela para trazer um sistema previdenciário que funcione, pelo menos até o próximo natal! Por falar nisso, o SIBE abriu para cadastrar a exigência???

    ResponderExcluir
  3. Abri para cadastrar, mas deu erro geral do sistema na hora de registrar a ciência do segurado e de agendar a data do cumprimento...
    Outro presente de grego do Papai Noel (dataprev claus) foi o novo correio...
    Uns perderam todos os e-mails recebidos e enviados, outros só veem tela cinza... eh beleza!!
    Quem mandou ser um menino levado?

    ResponderExcluir