Além do contato com tantas pessoas, muitas delas doentes, da pestilência de certas carteiras profissionais e carnês, da falta de uma adequada ventilação do ambiente, notórios entraves à saúde do servidor da APS, enumeramos a seguir outros itens do nosso insalubre dia-a-dia:
O celular: Você tem dois minutos para consultar os seus alfarrábios mentais e responder a uma pergunta bastante simples: Quem inventou o celular?
Aposto que o primeiro nome que lhe veio à mente foi Graham Bell e, os seguintes Thomas Edison, Bill Gates, Steve Jobs... Mas este senhor ilustre, o Graham Bell pós-moderno, que atende pelo nome de Martin Cooper, não lhe ocorreu. Não lhe parece estranha tão pouca notoriedade para o criador de um aparelho tão cobiçado, utilizado no mundo todo e por representantes de todas as classes sociais? Logicamente há um motivo para que esse grande inventor de idade provecta manter-se melhor escondido até mesmo que Bin Laden, que este já encontrou o seu destino. Então, para descobrir o segredo que envolve este pequeno instrumento é só trabalhar no INSS e ficar o dia inteiro ouvindo os mais variados e irritantes sons do infinito repertório proporcionado por esse cada vez mais eclético objeto. Não se passam cinco minutos sem que um deles dê o ar de sua graça numa aguerrida competição onde é difícil escolher o toque mais insuportável. E para que mais serve um celular numa APS? Para jogar uns games bobocas e sempre em elevada sonoridade enquanto se aguarda a senha ser chamada (Plim plim poin poin tóin tin friiiir); para fazer críticas e reclamações em particular ouvidoria (Isso aqui é um inferno, essa gente é um bando de vagabundo, eu vim com o fulano porque sabia que ia dá pobrema e outras mais delicadezas direcionadas indistintamente a todos os servidores); para blefar (Eu estou aqui na agência ....... e a mocinha que me atendeu parece não ter gostado muito de ouvir umas verdades que eu lhe disse e agora está lá dentro, há mais de meia hora, me dando um chá de cadeira. Tome logo as providências cabíveis...); para filmar e fotografar os servidores que, na opinião do segurado, estão batendo papo quando, estão resolvendo assuntos de trabalho (Vou botar no Youtube, vou levar pro jornal esse bando de vagabundo). Por tudo isso se percebe o que não faria um servidor da Previdência Social se um dia se encontrasse com o responsável de tamanha violência auditiva e se compreenderá porque se esforça ele por se manter em quase total anonimato.
O banheiro: Os banheiros das APS costumam ser pouco espaçosos e carentes de janelas ou ventilação. Por sorte, a queda de alguma placa de rebaixamento do teto, o que não é raro de acontecer, dado o estado de conservação da maioria das agências, propicia um melhor arejamento do ambiente que se abre para um espaço mais amplo, como uma janela para a escuridão.
Vejamos uma situação: Tenta o colega, entre um atendimento e outro, usar o banheiro. Na primeira tentativa ocorre encontrar o mesmo em fase de limpeza sendo impedido de entrar por uma barricada erigida por baldes, panos de chão, vassouras, escovas, garrafas de desinfetante e volta outra vez para o balcão para habilitar mais outro benefício, reprimindo uma justificável necessidade. Uns quarenta minutos depois, evidentemente muito mais necessitado, retorna ao banheiro, abre a porta, e suas narinas são mortalmente atingidas por eflúvios putrefatos que emanam daquele depositário do resultado final de uma feijoada mal digerida; atordoado por tal agressão olfativa, chega a perder a noção do que ali viera fazer, dá uma meia volta em busca da direção precisa e retorna para habilitar mais um outro benefício, sabe-se lá agora em que condições fisiológicas e até mesmo psicológicas, esperando, quase alucinado, o momento de uma terceira tentativa. Oremos por ele.
O colega chato: Pior que o mais ranzinza dos segurados é o colega chato pois nenhum segurado permanece o dia inteiro na agência atazanando o servidor. O chato tem diversas graduações que vão do enjoadinho ao insuportável. Tem aquele que irrita por falar muito alto para todos ouvirem e aquele que usa um tom confidencial suspirado, de qual não se entende nada, e você, que não está interessado em saber do que se trata ainda tem que pedir para a pessoa repetir o que disse ou então dar aquele risinho amarelo para que ela se afaste logo. E, assim, você ainda fica sem saber do que riu. Tem aquele que se acha muito espirituoso e dá longas gargalhadas quando conta uma piada sem graça ou faz um trocadilho igualmente inócuo. E o outro que não lhe dá escapatória, gosta de muita proximidade e vai avançando em sua direção até o encostar contra a parede. Normalmente, para piorar, este costuma sofrer de halitose. Agora, o mais desagradável de todos é aquele a quem você pretende deixar bem claro que o acha um container de amolação, diz-lhe isso na cara dele e o ilustre ainda fica arranjando desculpa para o seu procedimento, sugerindo que você está nervoso por algum motivo pois esse nada modesto cidadão se acha tão interessante e sedutor que não imagina que o outro possa ter opinião diversa.
Obs: Não foi considerado, neste item, em respeito à uma desejável integridade física, o colega de categoria superior, também conhecido como gerente e a quem não se deve, de modo algum, provocar (ainda tenho um olho roxo...).