Hoje iremos tecer algumas considerações sobre aquele espécime supérfluo que contribui para o acúmulo desnecessário de pessoas nas agências da Previdência Social que é o acompanhante do verdadeiro interessado. Vamos, portanto, desvendar o mistério da multiplicação de segurados numa APS.
1 - Existem dois tipos de acompanhantes: o sem fins lucrativos, representado por maridos, esposas, filhos, amigos e vizinhos e o profissional, também autodenominado “assessor previdenciário”, mais conhecido como catador de papel e que sempre ouve o tilintar de cifrões diante de um possível freguês.
2 – Enquanto os segundos comparecem ao atendimento de seu cliente apenas para marcar presença e garantir o próprio lucro, os primeiros se esmeram em orientar os pupilos. Ambos se dedicam a traduzir o que o servidor diz em palavras mais simples de modo a facilitar o diálogo entre as partes. Por exemplo, quando o servidor diz: “Dona Maria, me empresta sua identidade e seu CPF” o acompanhante intervém e fala: “Dona Maria, empresta a identidade e o CPF para o moço”, evitando, assim, qualquer possível mal-entendido.
3 – O acompanhante sempre chega ao destino antes do real interessado. Como um desbravador ele percorre a agência em busca da mesa que chamou a senha conduzindo com segurança o seu protegido até o lugar indicado. Uma vez ali, responde à todas perguntas feitas ao segurado antes mesmo que ele possa esboçar um início de resposta; acompanha, passo a passo o atendimento, oferecendo esclarecimentos absolutamente desnecessários; questiona a legislação por julgá-la injusta e, ao final, dá permissão ao seu tutelado para assinar documentos, após análise e aprovação do texto, não sem antes pôr em dúvida algum detalhe do mesmo. Ao ir embora, dá um sorriso de triunfo imaginando que nada daquilo teria acontecido em sua ausência.
4 – Engana-se aquele que imagina que a pessoa em questão é convidada pelo requerente a fazer-lhe companhia. Pelo contrário, ao saber que o parente, amigo do parente ou vizinho do amigo do parente vai até o INSS em busca de um benefício, ele se propõe a ajudá-lo com o magnânimo propósito de protegê-lo dos maus-tratos a que provavelmente será submetido pelos servidores da malvada autarquia que nega uma aposentadoria até mesmo para aquele que, segundo seus cálculos, já tem mais de 150 anos de contribuição.
5 – Os acompanhantes também podem vir em grupos distintos e que se classificam em escolta e filharada. A primeira composta, costumeiramente, de dois a cinco integrantes, acompanha um requerente que não tem direito ao benefício e o faz com a sutil intenção de intimidar o servidor a fim que ele olhe a realidade por outro ângulo nem que para isso tenha que levar um direto no queixo. O lado masculino do aparato costuma se postar à volta do cidadão, de braços cruzados sobre o peito e com cara de ‘te pego lá fora’, As mulheres, mais comunicativas, utilizam-se de uma interpretação livre da lei adequando-a aos interesses do requerente, nem sempre no tom de voz considerado apropriado ou com vocabulário elegante.
6 - Muitas mães, ansiosas por um benefício assistencial que provenha a si e à prole, levam a escadinha toda entre 6 meses e 13 anos, em média, onze degraus, com a finalidade de comover o atendente. Enquanto o colega cadastra aquele monte de crianças, uns correm, outros pulam, todos gritam e o menorzinho, sem poder participar da brincadeira, expressa-se fisiologicamente, enchendo a fralda e empesteando o ambiente. Consultando o CNIS verifica-se que a requerente não teve outro trabalho a não ser o do parto mas honras lhe sejam feitas porque não é pouca coisa colaborar com tal vigor para o crescimento populacional.
7 – Para que o servidor sobreviva a todos esses contratempos é bom que ele também tenha lá um acompanhante ou uma comitiva, conforme o caso, que possa neutralizar o ataque alheio. Sempre é bem-vindo aquele colega que se posta ao lado do companheiro e, caneta e papel na mão, começa a fazer uma sutil e insistente entrevista, perguntando o motivo de sua vinda, grau de parentesco com o segurado, o objetivo de tantas perguntas e pedindo os seus documentos para uma posterior averiguação, de forma a reverter a pressão exercida a principio pelo outro lado. Se, com essas providências o camarada não ir embora alegando alguma urgência, pelo menos ficará menos agitado.